Embora já morasse em uma cidade de porte médio e a violência fosse eminente, as preocupações eram muito menores. Não imaginávamos que palavras como pedofilia fossem tomar conta dos noticiários e roubar a infância de tantas crianças e a tranqüilidade de tantos adultos. Brincávamos na rua. Éramos felizes, não tínhamos brinquedos caros, muitos de nós nem brinquedos tinha. Apenas brincávamos.
Nessa convivência gostosa, aprendemos muitas coisas, mesmo antes de sair de casa, regras eram estabelecidas, valores foram transmitidos, sem perceber brincávamos e aprendíamos. Caso alguém fugisse da regra seria “castigado” , ia ficar em casa, não ia brincar com os coleguinhas no dia seguinte – isso era triste demais.
Nossos pais nos alertavam: nada de brigas, não se meta em confusões, peça desculpas, diga obrigado, não passe entre pessoas conversando sem pedir licença, não fique ouvindo conversas alheias, não fale aquilo que não tiver certeza para evitar fofocas, cuidado para não se machucar!
Hoje as crianças não são preparadas para conviver. As crianças cada vez mais curtem brincadeiras solitárias em frente ao computador, ao vídeo-game... estão sempre sozinhas, quase nunca brincam em grupo. A violência e a modernidade fizeram com que os pais resignificassem a infância de brincadeiras e valores e transformasse a infância em uma fase solitária e muitas vezes fria, egoísta. Quando vão para os grupos, as crianças têm dificuldade de ouvir, de respeitar, de abraçar, de brincar e aprender convivendo com o outro. Muitas são agressivas.
Aprendi com as quedas, aprendi com as imposições da minha mãe sobre os horários de saída e chegada, aprendi com os meus amigos e com as regras das brincadeiras, aprendi a perder, a ganhar e a respeitar o outro. As crianças de hoje aprendem com as máquinas, os pais por sua vez dizem orgulhosos: “vou trabalhar para dar ao meu filho tudo o que não tive!” e assim desvalorizam tudo o que receberam de valores e reduzem o “dar tudo” a objetos e brinquedos que os tornam mais solitários, egoístas o reflexo disso geralmente se apresenta com crianças que nasceram velhas, estressadas, como se tivessem problemas de adultos, preocupações de adultos, sentimentos maus como os adultos às vezes geram.
Os ombros dos professores e catequistas têm um peso sem medida: ensinar e transmitir valores que já deviam estar garantidos quando as crianças chegassem na Escola ou na Catequese. O que será da criança quando o computador quebrar? O vídeo game pifar? O MP10 estragar? Que presentes podem de fato fazer a diferença na vida de nossas crianças?
Você certamente percebeu se seus catequizandos sabem rezar. Faça uma pesquisa em sua turma de Catequese e verá que grande parte daqueles que sabem aprenderam com as avós, pois os pais embora saibam rezar estão muitas vezes preocupados em “dar tudo o que não tiveram” e esquecem de dar aquilo que tiveram e que foi e é essencial em toda família: atenção, carinho, orientações, limites, amor.
Enquanto cultivarmos em nossos lares a cultura do ter em detrimento da cultura do ser, fazendo de datas como o dia das crianças e o natal momentos de escamotear as nossas reais responsabilidades ao utilizarmos “presentes” para camuflar nossas ausências, estaremos contribuíndo para que mais uma criança seja órfã de pais vivos.
Clécia Ribeiro
Clécia é catequista na Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro da Arquidiocese de Feira de Santana/Ba
1 comentários:
Muuuuuuuuuito bom mesmo!
Clécia eu sou sua fã nº 1!
Excelente texto...
Deus te abençoe cada dia mais, e que Ele continue lhe dando toda essa inspiração divina! Te adoro! E já sinto saudades...
Sandra Avelino
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Que a graça e a paz de Nosso Senhor Jesus Cristo lhe acompanhem!
Seu comentário é precioso.
Muito obrigada!
Afetuosamente,
Clécia e Sandra